Comentário

O papel da social-democracia<br>em Portugal e na UE

Inês Zuber

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A social-democracia europeia, a braços com a sua cumplicidade activa na promoção das políticas que estão, em vários países, a transferir as riquezas dos povos e dos trabalhadores directamente para as mãos do grande capital, tenta hoje a todo o custo branquear as suas responsabilidades, aceitação e comprometimento com a prática da extorsão e aniquilação das potencialidades de desenvolvimento dos países, sobretudo periféricos, como o nosso. Sim, é verdade que a maioria do Parlamento Europeu, da direita à social-democracia, aprovou e caucionou os grandes instrumentos macroeconómicos que condicionam fortemente a despesa e o investimento público e apontam o caminho da supressão dos serviços públicos e o modelo de flexibilidade nas relações de trabalho como solução para a tão propalada «competitividade». Sim, sancionaram-nos todos: as políticas da Governação Económica, o Semestre Europeu, o Pacto para o Euro +, o Pacto de Estabilidade e Crescimento, o Tratado Orçamental. Não obstante esse pormenor, a social-democracia, na União Europeia como em Portugal, esforça-se determinadamente por apagar essas responsabilidades, invocando as suas preocupações com o crescimento e com a ausência de preocupações sociais que determinam as políticas «ditas» de consolidação orçamental que caucionou, sempre e em todos os momentos, diligentemente.

Na semana passada, no plenário do Parlamento Europeu, o relatório Cercas sobre os processos de reestruturação empresarial foi apresentado pelos socialistas como uma solução inovadora para proteger os direitos dos trabalhadores. Mas o que dizia o relatório? Partindo da aceitação da necessidade das reestruturações como consequência das mudanças económicas – conceito que inclui tudo, inclusive as consequências das políticas recessivas que não são inevitáveis mas opção política – o relatório considera que os despedimentos devem ser minimizados e postos em prática como último recurso, devendo-se estudar as diversas alternativas possíveis, como a renegociação das «condições de trabalho». Em última instância, claro está, o despedimento é a solução possível, mas o grupo dos «Socialistas e Democratas» aponta-nos uma melhoria considerável: os trabalhadores deverão ser envolvidos nesse processo, consultados e informados atempadamente. O que, evidentemente, tem pouca utilidade para quem vai ser despedido num contexto económico de desemprego estrutural.

A Resolução sobre a «viabilidade da introdução» dos chamados eurobounds continha uma das soluções propagandeadas pelos sociais-democratas como um grande projecto da «solidariedade europeia». A introdução de eurobounds, ou seja, a mutualização da dívida soberana e a emissão comum de dívida, constitui um processo que não rejeita nem as políticas que provocaram os défices excessivos dos países – como a introdução do mercado único que, por exemplo, em Portugal, teve como consequência o aumento de importações e a desindustrialização do País – nem rejeita a chantagem que é feita pelo sistema financeiro aos países através das taxas de juro e do acesso ao crédito. A introdução de eurobounds tornaria países como nosso ainda mais dependentes das imposições das grandes potências – que seriam, na prática, os «fiadores» da nossa dívida soberana – e, portanto, das imposições que estas, no comando das políticas da UE, ditariam sobre o nosso País. Este relatório confirma a chantagem que se pretende fazer sobre os «estados-membros» a propósito da introdução dos eurobounds: diz que esta só pode ser acompanhada de «disciplina e controlo orçamental», saúda os «esforços já desenvolvidos pelos estados-membros em matéria de consolidação orçamental», defende que «mesmo sob o regime de emissão de obrigações comuns (eurobounds) todos os estados-membros são obrigados a reembolsar a sua dívida na íntegra», (ideia que se opõe à necessária «renegociação da dívida» que sempre defendemos). Os deputados do PCP no PE foram os únicos deputados portugueses a votar contra esta resolução. Todos os outros votaram a favor: do CDS-PP, do PSD, do PS e do BE. Caso para dizer – cada um desempenha o seu papel no combate político, como fica aqui bem demonstrado.



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